Meu corpo é a única coisa que tenho
que é nada
e como suicida
luto contra moinhos, tempestades e solidão
que é tudo.
Escondo-me nesta armadura de ossos,
carne
e vestimentas
e espio a vastidão do mundo pelos buracos dos olhos
como quem espia lugares estranhos
infinitos
perigosos.
Meu corpo é a única coisa que tenho
para carregar o pretexto da alma.
É magro, feio e escandaloso
o corpo
mas é única coisa que tenho
para caminhar pelo tempo e pelos sertões.
Garantia não tenho
se o meu corpo é forte e frágil ao mesmo instante
se sujeito-me ao abismo
ao chão
à poeira
se estou marcado para me tornar saudade
lembrança
e fotografias
e minha história não terá mais
um cavalo para montar
e serei uma estátua invisível no espaço.
Garantia não tenho
de nada
nada
não levarei escondido no bolso
nenhuma semente
nenhum suspiro
nenhum gesto
pois tudo é podre
condenável
consumível.
Só é garantido o mais difícil:
a miragem na imensidão
o que se supõe ao longe
o completo mistério
para se chegar até lá
não se sabe com que corpo
não se sabe com que asas
não se sabe.
(do livro “Poesia provisória”)
10 comentários:
lindíssimo, nirton!
"não se sabe com que corpo
não se sabe com que asas
não se sabe"
eu sei que vc chega a mim com poesia.
chega, sim!
armadura - esse título tbm faz com que o poema tenha peso...
lindo, lindo
e emocionante!
Voce tambem tem um "Q" de livre.
Simplesmente chega.
beijos
Adrianna,
se eu chego até você com poesia, valeu a pena que escreveu o poema...
beijo.
liberdade atraindo liberdade, Karla.
Por isso a gente se encontra.
beijo.
Assim, de leve, me fez lembrar de um poema gigantesco que eu havia escrito faz tempo: "Decidi caminhar (As areias)"
1[]!
As inquietações dos poetas muitas vezes se cruzam, caro J.F. E até se cumprimentam pelo caminho.
"Armadura" se prende numa narrativa poética enquanto "As areias" tem uma estrutura que evoca elementos da parábola. Ambos os textos, inquietos - como deve ser o olhar do poeta.
"Armadura" tem mais de vinte anos, e ganhou um prêmio num concurso da Scortecci Editora.
simplesmente maravilhoso seu poema.
abraço
Legal saber disso, caro Nirton! =)
1[]!
Muito bom, Nirton! Abraço!
Belo poema, Nirtão! bacana sua ligação ao texto sobre woody allen no face!
em corpo incorporado!
grande abraço.
Postar um comentário