(Os poemas aqui publicados estão registrados na Biblioteca Nacional. Podem ser reproduzidos desde que mencionados a fonte e o autor)
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
quinta-feira, 29 de novembro de 2007
desmontando as tardes
As estacas não criam raízes no chão da cidade.
quinta-feira, 15 de novembro de 2007
postura
Cada gesto posto no espaço
me subtrai (um pouco) a intimidade.
Mas não há como negar
o tamanho do rosto
e esconder-se da luz diante do espelho.
Tenho (sem saída)
a vida presa aos pulsos
o corpo atracado ao tempo
levando-me neste soluço constante
nesta postura indecente
nesta vontade (sempre!)
de ser feliz.
A idade é pouca
sobre a carne que preciso ter
para descobrir o que esconde
o silêncio de amanhã
e me deixa com as mãos
curiosas
os sentimentos
acesos
o coração
(in) quieto.
Por isso
no estrondo dos dias nas ruas
na solidão das cercas na noite
mantenho o olho aberto
pastorando (e me resgatando a)
cada instante
em que a vida não cochila.
(do livro “Poesia provisória”)
segunda-feira, 5 de novembro de 2007
sábado, 27 de outubro de 2007
unidade
tem sua porção de vida
tem sua imensidão de luz
tem sua solidão de gente
cada dia
cabe em si mesmo
como cabem na terra
a colheita e a semente.
Cada dia
tem seu ontem e amanhã
tem seu silêncio de espera
tem sua largura de saudade
cada dia
cabe em si mesmo
como cabem no continente
a distância e a cidade.
Cada dia
tem seu mar e os peixes
tem seus barcos e as viagens
tem seus remos e mãos fortes
cada dia
cabe em si mesmo
como cabem no porto
o rumo do sul e do norte
quarta-feira, 17 de outubro de 2007
o morto
O morto
tomou destino ignorado:
em que planície nos céus
sibila o seu silêncio?
Com sua armadura desfeita
o que resta é inútil:
não suporta o vento
(que sopra com a chuva)
não será restaurado nos museus
(que espiam a história)
nem se moverá com as lembranças
(que amontoam os retratos).
O morto
tomou destino ignorado.
II
Não tenham medo:
o morto não se levantará
de sua solene posição
deitado como nunca
com seu nariz e seu sapato
em
riste.
III
O morto
(saibam)
não segue no cortejo:
segue um morto
(peso inútil)
que o limite do nosso olho vê.
IV
O morto independe da vontade
dos que lhe jogam areia e flores
dos que lhe dizem orações e calam
dos que choram e esquecem
- o morto
agora
é eterno.
V
Lembramos o tamanho do morto
com suas roupas
com sua voz
com sua dor
e choramos o tamanho que falta
a lágrima que salta
em nós
até quando aprendermos
a não ser somente vivos.
VI
De nada mais sabemos
até que o morto nos mande notícias
e que seu vulto passe ao longe
como passam os viajantes
(depois)
do entardecer.
VII
Maior é o morto
na viagem
que ele continua
(em que planície nos céus?).
sexta-feira, 12 de outubro de 2007
segunda-feira, 24 de setembro de 2007
impregnados
Ele fechou a porta e saiu. Precisava ir embora. Não era o que ele queria: era o que precisava. Não lhe era fácil ouvir o que ouviu e ter de ir embora. Fechou a porta e saiu. Agora as palavras ficaram atrás da porta, lá dentro do quarto. E dentro dele também continuariam. “Não vou tomar banho”, disse ela. Ele ouviu e não entendeu. Ela, com o rosto virado e apoiado nas duas mãos juntas, repetiu baixinho “não vou tomar banho”, como se agora fosse somente para si. Mas ele ouviu as palavras sussurradas no dorso das mãos, ali do outro lado, ela de costas para ele, ele que fixava o olhar no teto. Desprendeu-se, virou o rosto e olhou para ela. O cabelo cobria-lhe a nuca. O olhar dele tentou desembaraçá-los e atravessar até o outro lado, ver o seu rosto, ouvir de novo o que ela falara. “Nunca mais vou tomar banho, nunca mais”, continuou ela. Esboçou um gesto de afago em seus cabelos, não para que ela virasse o rosto, o que poderia ter sido ótimo, e esta história seria diferente, mas ele não fez da intenção um gesto sequer. Voltou o rosto para o teto. “Quero ficar com seu cheiro em meu corpo”, disse ela mais uma vez, alongando-se nas palavras, e foi no momento em que ele fechou os olhos para não ficar mais uma vez fixo naquele branco do teto, naquela lâmpada apagada, naquela luz do dia que começava. Fechou os olhos e as palavras dela entraram mais fortemente em seus ouvidos. “Para sempre... quero ficar com seu cheiro pra sempre”, era quase um murmúrio, mas ele ouviu nitidamente cada palavra, ali do outro lado, com o rosto nas mãos juntas, as mãos por cima do travesseiro fino. Ele não conseguia abrir os olhos. As palavras ressoavam em sua cabeça, se estendiam lentamente lá por dentro e sumiam quando novamente as palavras voltavam, “seu cheiro em mim... pra sempre”. Abriu os olhos, decidira, precisava ir embora: não queria: precisava. Levantou-se e o ruído da cama encobriu uma talvez repetida fala. Ele vestiu-se enquanto olhava para ela, ali deitada, confundida entre os panos, a brancura dos lençóis, a extensão da cama que parecia maior agora. Não podia ficar olhando-a, ou ficaria ali. Não queria ir embora: precisava. Virou-se e foi em direção à porta. Abriu lentamente, como se ela estivesse dormindo e não quisesse acordá-la. Fechou a porta e saiu. Precisava ir embora. Não era o que ele queria: era o que precisava. Não lhe era fácil ouvir o que ouviu e ter de embora. Fechou a porta e saiu. Agora as palavras ficaram atrás da porta, lá dentro do quarto. E dentro dele também continuariam.
sábado, 15 de setembro de 2007
domingo, 26 de agosto de 2007
esconde-esconde
segunda-feira, 23 de julho de 2007
migrante
em que acreditar
além da cidade onde queremos morar
e em sua direção
afivelamos nossas malas
(com roupas e retratos)
enchemos nosso peito
(de esperança e saudade)
abrimos nossos olhos
(de horizonte e espanto)?
em que acreditar
nessa (qualquer) cidade
construída de concreto e traços
além da argamassa dos nossos sonhos?
mas se na cidade
cabe a pedra
cortada em mil pedaços sobre a solidão
caberá (muito mais)
a nossa vontade
solta em muitos corações e braços
povoando a paisagem e a distância.
sábado, 7 de julho de 2007
per si
na minha poesia.
Não se meta onde é chamado.
Faça de conta
que não escuta os meus apelos
e me deixe encontrar
esse endereço errado.
Quero meu desencanto legítimo
e esse beijo desfazendo a azia.
Não me venha com tradução simultânea
para música que me castiga.
Não me meta onde sou cantado.
Faça de conta
que não entende esse estrangeiro
e me deixe desencontrar
esse futuro passado.
Quero o ronco do meu íntimo
e este coração que a alma mastiga.
(do livro “Poesia provisória”)
quarta-feira, 27 de junho de 2007
ventania
sexta-feira, 22 de junho de 2007
Luar
Ando.
Uma réstia toca a minha pele.
Esqueceram a lua acesa.
(do livro “Raios”)
quarta-feira, 13 de junho de 2007
terça-feira, 12 de junho de 2007
namorada
quarta-feira, 30 de maio de 2007
sábado, 19 de maio de 2007
quimera
sexta-feira, 11 de maio de 2007
profano
às vestes e às paixões
se eu não calo o canto
se eu não sigo as setas
se eu não cesso os beijos
isso
quando mais ardem
fora e dentro de mim
as vestes e as paixões.
(do livro “Roteiro dos pássaros – remixado”)
quinta-feira, 10 de maio de 2007
sobre viver
se sentarmos
à mesma mesa
e trocarmos olhares
como amigos
ou como sobreviventes.
(do livro “A paisagem e a distância”)
quarta-feira, 2 de maio de 2007
o morto
O morto
tomou destino ignorado:
em que planície nos céus
sibila o seu silêncio?
Com sua armadura desfeita
o que resta é inútil:
não suporta o vento
(que sopra com a chuva)
não será restaurado nos museus
(que espiam a história)
nem se moverá com as lembranças
(que amontoam os retratos).
O morto
tomou destino ignorado.
II
Não tenham medo:
o morto não se levantará
de sua solene posição
deitado como nunca
com seu nariz e seu sapato
em
riste.
III
O morto
(saibam)
não segue no cortejo:
segue um morto
(peso inútil)
que o limite do nosso olho vê.
IV
O morto independe da vontade
dos que lhe jogam areia e flores
dos que lhe dizem orações e calam
dos que choram e esquecem
- o morto
agora
é eterno.
V
Lembramos o tamanho do morto
com suas roupas
com sua voz
com sua dor
e choramos o tamanho que falta
a lágrima que salta
em nós
até quando aprendermos
a não ser somente vivos.
(do livro “Poesia provisória”)
quinta-feira, 26 de abril de 2007
armadura
que é nada
e como suicida
luto contra moinhos, tempestades e solidão
que é tudo.
Escondo-me nesta armadura de ossos, carne
e vestimentas
e espio a vastidão do mundo pelos buracos dos olhos
como quem espia lugares estranhos
infinitos
perigosos.
Meu corpo é a única coisa que tenho
para carregar o pretexto da alma.
É magro, feio e escandaloso
o corpo
mas é única coisa que tenho
para caminhar pelo tempo e pelos sertões.
Garantia não tenho
se o meu corpo é forte e frágil ao mesmo instante
se sujeito-me ao abismo
ao chão
à poeira
se estou marcado para me tornar saudade
lembrança
e fotografias
e me história não terá mais
um cavalo para montar
e serei uma estátua invisível no espaço.
Garantia não tenho de nada
nada
não levarei escondido no bolso
nenhuma semente
nenhum suspiro
nenhum gesto
pois tudo é podre
condenável
consumível.
Só é garantido o mais difícil:
a miragem na imensidão
o que se supõe ao longe
o completo mistério
para se chegar até lá
não se sabe com que corpo
não se sabe com que asas
não se sabe.
(do livro “Poesia provisória”)
sábado, 21 de abril de 2007
harmonia
um tom sobre o tom:
como o azul
sobre o pássaro
como o meu carinho
sobre o teu.
(do livro “Poesia provisória”)
segunda-feira, 16 de abril de 2007
parecer
pode guardar
pode rasgar.
Tenho versos para todos os desgostos.
(do livro “Poesia provisória”)
sábado, 7 de abril de 2007
verso
sobre os aviões e os pássaros:
nas asas de um
é tudo muito rápido
nas asas do outro
é tudo muito livre."
(do poema "Abstrato" no livro "Poesia provisória")
segunda-feira, 2 de abril de 2007
reversos - um
quinta-feira, 29 de março de 2007
carinho
Minha mão passeia
sobre a fertilidade de tua pele
e não existe nada mais além desta
eternidade.
Passeia como se voasse
(se pássaro eu fosse
e asas minhas mãos lentas)
mas é vôo
tudo que o amor
neste momento conduz ao sempre.
quarta-feira, 7 de março de 2007
cofre
quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007
apartado
quando as coisas estão paradas.
É por você está longe
e não ter previsão alguma do tempo
que o presente continua sobre a mesa.
O mundo parece inútil
nesse pedaço em que não posso tocá-la.
Deve ser impressão desfocada dos olhos
ou sua ausência é uma eternidade em mim e na sala.
Há um telefone, uma porta e meus passos contidos.
Para cada lado o espaço para se medir.
O coração achará em algum canto as chaves e os motivos
para lhe encontrar na volta em vez de partir.
O medo nos distancia
das coisas em movimento.
(do livro “Poesia provisória”)
domingo, 11 de fevereiro de 2007
linha
no meio da sala
é a mesma que estranhamente
nos enlaça
e assim como nos ameaça
nos joga no mesmo abraço.
Se você parte por um século
ou por segundos me ausento,
fica sempre do outro um pedaço
na viagem solitária
de quem segue em desalento.
(do livro “Poesia provisória”)
domingo, 4 de fevereiro de 2007
solo
quinta-feira, 25 de janeiro de 2007
promessa
que me amaria para o resto da vida.
Ela me disse.
Como a vida é curta.
(do livro “Raios”)