Em pleno início da pandemia, o poeta cearense Clauder Arcanjo estava em Vitória (ES) a trabalho. Confinado em um hotel, durante três meses passou a ler e e screver para não enlouquecer. Nessa clausura sanitária e intelectual, Arcanjo revisitou obras de quase 30 escritores. De Clarice Lispector a Emily Dickinson, de Walt Whitman a Ferreira Gullar, de Hilda Hirst a Cecília Meireles, de Fernando Pessoa a Carlos Drummond de Andrade, de Mário Quintana a Vinicius de Moraes, de Miguel de Cervantes a Eugênio de Andrade, de Cora Coralina a Manoel de Barros, e mais Adelia Prado, Manuel Bandeira, Beatriz Alcântara, Helena Kolody... Dessas releituras, Clauder escreveu sobre cada um deles. Paria três textos por semana. E dialogava com os autores destacando trechos de seus livros em sintonia com seus sentimentos, suas inquietações e reflexões. O resultado desse período de exilio na solidão de um quarto de hotel, é o livro Confidências literárias (Sarau das Letras Editora, 2021), de uma originalidade e preciosidade como raramente vi na literatura brasileira contemporânea. O seu texto em prosa, num misto de ensaio analítico e crônica existencial, é de uma poética cativante. Os versos que ele destaca, numa intextualidade cuidadosa, se unem organicamente com o que ele escreve, um auscultando o coração do outro.
E domingo passado fui surpreendido como mais um poeta com quem ele se confidencia, a partir da leitura do meu livro Trem da memória (Editora Radiadora, 2022). Clauder Arcanjo publicou nosso encontro memorialista no jornal O Mossoroense, onde é articulista. São textos que ele reúne para uma próxima edição de Confidências. Como todo grande poeta e seus berços referenciais, Arcanjo é originário da cidade Licária, como Bandeira foi para Pasárgada, Gabriel García Márquez morou Macondo, Drummond veio de Itabira. Honra-me passar uns dias em Licária, lá sou amigo de Arcanjo.