Ilustração: Daniel Kondo
Numa das primeiras vezes que Hermeto Pascoal fez show em Brasília, ficou encantado com a cidade. Não exatamente com a arquitetura diferente, mas com o verde por todos os lados.
Quando o carro, vindo do aeroporto em direção ao hotel, entrou no Eixão Sul, uma das largas avenidas de seis faixas que formam o desenho da asa do avião, o músico esverdeou seu olhar albino.
Durante o percurso, entre silêncios e murmúrios melódicos improvisados, elogiava a paisagem na rodagem horizontal da janela.
Em um momento, disse, mais para si do que para quem estava ao seu lado: “Só faltam uns cabritinhos pastando nessa grama”.
Esse episódio sempre me comoveu. No livro de poemas que estou finalizando, A distância e a paisagem – Escritos sobre Brasília, menciono em um trecho:
“e os bodes pastando no verde do Eixão
que o bruxo Hermeto chegando imaginou”.
Ele partiu ontem aos 89 anos.
Ficam na história da música brasileira, em nossa memória afetiva e no molde da saudade, seus hermetismos pascoais que nos salvam e sempre nos salvarão dessas trevas, como bem definiu Caetano.
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